Por Lúcia Müzell |
Nesta quinta-feira (15), completam-se quatro meses que um incêndio mudou a história da catedral de Notre-Dame de Paris. Desde então, aos poucos, a França define como será o trabalho de reconstrução do monumento, que deve levar no mínimo cinco anos. Projetos arquitetônicos ousados foram pensados por escritórios do mundo inteiro, inclusive por um brasileiro: Alexandre Fantozzi, designer do AJ6 Studio, foi um dos primeiros a publicar uma proposta de restauração, que transforma todo o telhado da catedral em uma estrutura de vitrais.
A ideia foi lançada em um post no Instagram e resultou em uma imensa repercussão mundial. Fantozzi foi citado por mais de 100 jornais dos cinco continentes, nas reportagens sobre os desenhos mais audaciosos para refazer a catedral, após o governo francês informar que lançaria um concurso internacional para a escolha do projeto.
“Nossa proposta é mais contemporânea, sem deixar de ter essa relação com o passado, trazendo o vitral para o futuro”, explica o designer, que agora finalizou uma versão mais completa do projeto inicial, com apoio técnico de engenheiros e arquitetos e a valiosa contribuição do professor de História da Arte João Braga. “Para quem vê, é o mesmo vitral do início, mas tem características mais sustentáveis, isolação térmica e acústica, além de ser muito leve.”
O projeto "Coroa Divina" ainda contou com consultoria da fabricante francesa Saint-Gobain, dona da tradicional vidraçaria Saint Just, com mais de 170 anos de experiência em vitrais. “Eles têm contato direto com o corpo técnico da Notre-Dame”, frisa Fantozzi, na expectativa de que os croquis cheguem às mãos da comissão de especialistas do Ministério da Cultura que vai analisar as propostas de restauração.
Em entrevista ao RFI Convida, o designer ressalta que “a preocupação estrutural” gerada pelo incêndio “é real”. O fogo consumiu todo o telhado e a agulha da catedral, construídos há mais de 800 anos. A destruição, que por pouco não levou todo prédio abaixo, exige agora uma cobertura “mais leve possível”, afirma Fantozzi.
“Tem um único ponto no qual usamos uma estrutura de pedra, na base da flecha. Mas o restante é bem leve, com aço carbono e vidros”, complementa o paulistano. “Na parte interna, pensamos numa passarela suspensa por cabos de aço, ou seja, nada está apoiado. E, da passarela, poderíamos olhar mais de perto a cobertura da catedral.”
Memorial do incêndio
O projeto prevê que a agulha – de desenho idêntico à original, porém feita em vitrais - ficaria aberta para visitação e ofereceria uma vista privilegiada da capital francesa e da própria catedral. Além disso, o escritório previu um monumento de lembrança do incêndio, que seria construído na parte externa do prédio, com pedras e madeira e outros materiais queimados em 15 de abril de 2019.
O governo francês ainda não deu detalhes sobre quais serão as modalidades do concurso para a escolha do projeto de restauração. A pressão da sociedade e de políticos franceses é forte para que toda a parte destruída seja reerguida idêntica ao projeto original, em especial a agulha.
Em uma entrevista publicada no início de agosto, Philippe Villeneuve, arquiteto-chefe da Notre Dame admitiu que essa seria a sua preferência “pessoal”, mas disse que levará uma opinião imparcial para o comitê de especialistas que avaliarão as propostas.