O presidente argentino, Alberto Fernández, respondeu ao deputado Eduardo Bolsonaro, que afirmou nas redes sociais que "a Argentina virou uma calamidade" e afirmou que "o país foi destruído pelo governo socialista" de Fernández.
Márcio Resende, correspondente da RFI em Buenos Aires
Duas semanas depois do Brasil e da Argentina selarem uma trégua nos ataques verbais entre os presidentes Jair Bolsonaro e Alberto Fernández, que afetam as relações entre os dois principais parceiros na região, o deputado Eduardo Bolsonaro voltou a provocar fricção ao publicar no Twitter que o seu pai, Jair Bolsonaro, "acertou quando previu que a situação na Argentina viraria uma calamidade".
"Assista estes (sic) depoimentos de cidadãos argentinos e veja como o país foi destruído por seu governo socialista em poucos meses", atiçou o deputado em um vídeo editado de 2'19". Nas imagens, Alberto Fernández aparece advertindo aos empresários que "chegou a hora de ganharem menos" devido à quarentena.
No vídeo, aparecem cinco testemunhos de pequenos e médios empresários argentinos que tiveram os seus negócios comprometidos devido à quarentena. Os testemunhos são reais e foram exibidos pelo canal Todo Notícias, o principal do país em Jornalismo.No final do vídeo, o presidente Alberto Fernández, que avisava aos empresários que deveriam ganhar menos, aparece recusando-se a diminuir o seu próprio salário, a exemplo de vários presidentes de países da região. "A família do Bolsonaro está muito preocupada comigo e com a Argentina. Não sei. Não posso dizer muito sobre o que esse senhor disse", respondeu Alberto Fernández em referência a Eduardo Bolsonaro, durante uma entrevista com o mesmo canal Todo Notícias.
Sobre a relação com Bolsonaro, Fernández disse "não o conhecer", mas que "a relação entre a Argentina e o Brasil é indissolúvel", reforçando a sua estratégia de referir-se ao Brasil ou ao "povo brasileiro", mas não diretamente ao presidente Jair Bolsonaro.
Tênue trégua
Depois de oito meses de farpas e provocações de um lado e do outro, emperrando a relação bilateral, eixo da integração regional, Brasil e Argentina tinham ensaiado uma trégua depois do encontro, em Brasília, entre o presidente Jair Bolsonaro e o novo embaixador argentino no Brasil, Daniel Scioli. No último dia 19, o embaixador argentino levou uma mensagem de reconciliação de Alberto Fernández e antecipou que planeja o primeiro encontro entre os dois líderes até o final do ano.
"Para a Argentina, qualquer desencontro com o Brasil ficou no passado", disse Daniel Scioli depois da reunião. "Queremos, de coração, o melhor para a Argentina", reforçou Bolsonaro.
A crítica do deputado Eduardo Bolsonaro ao presidente Alberto Fernández encontra eco em boa parte da população argentina, principalmente os segmentos médio e alto, que acusam o governo argentino de usar a ferramenta da quarentena como única estratégia para conter o número de vítimas, pulverizando, consequentemente, a economia. A quarentena argentina foi renovada até, pelo menos, o próximo dia 20 de setembro, quando completará 184 dias, a mais prolongada do mundo.
"Não existe quarentena"
Nas últimas semanas, o presidente Alberto Fernández passou a negar que exista uma quarentena. A situação, em sua ppinião, é um "isolamento sanitário" de grupos de risco. "Não existe quarentena. A quarentena supõe o confinamento total de uma comunidade. Isso não existe. Nós pedimos um isolamento sanitário àqueles que estão numa situação de maior risco, maiores de idade e pessoas com doenças pré-existentes. O resto da população circula, sai de casa", disse Fernández, acusando a imprensa de publicar uma mentira.
"Os jornais podem publicar que estamos em quarentena, mas é mentira. É falso", insistiu, apesar de o país não permitir aulas presenciais, uso do transporte público para quem não for de um trabalho considerado essencial, circulação de pessoas e de veículos sem permissão especial, voos domésticos e internacionais, reuniões de amigos e parentes que não convivam ou crianças nas ruas das áreas mais povoadas do país.
Risco de colapso
Mesmo assim, depois de um isolamento iniciado em 20 de março, a Argentina passou a ter mais de 10 mil casos diários, apesar de ser um dos países que menos testa na região. Ao mesmo tempo, a Sociedade Argentina de Terapia Intensiva difundiu, nas últimas horas, uma carta na qual adverte que os profissionais da Saúde "sentem que estão perdendo a batalha" e que "na maioria das unidades do país, existe um altíssimo nível de ocupação" das Unidades de Terapia Intensiva.
Diante do risco de saturação do sistema, Alberto Fernández admitiu que monitora os números para evitar um colapso e que pode, de uma hora para outra, "apertar o botão vermelho", isto é, voltar à primeira fase do confinamento total, experimentada durante abril, quando a economia argentina despencou 26,4%.
"Pode haver um 'botão vermelho' porque eu não vou deixar que todo o esforço seja perdido. Em muitos lugares, a utilização dos leitos de UTI cresceu significativamente. Eu não vou permitir que essa situação chegue a um ponto de colapso. Estou acompanhando a ocupação dos leitos de UTI dia-a-dia", avisou o presidente argentino.