CURITIBA (Reuters) - O Brasil introduziu a questão das mudanças climáticas nas discussões sobre política energética e um dos temas no radar do governo é o uso de mecanismos de precificação de carbono no setor elétrico, disse nesta terça-feira o presidente de um órgão estatal de planejamento.
O chefe da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), Thiago Barral, citou o avanço de um programa estatal de certificados de descarbonização para fomentar o setor de biocombustíveis, o RenovaBio, e apontou que uma medida provisória recente poderá abrir caminho para mecanismos semelhantes para elétricas.
“Com a MP 998, a gente já dá um passo inicial no sentido de também já trazer essa discussão para o setor elétrico, mas olhando para o setor como exportador de descarbonização, de certificados de descarbonização”, disse Barral, ao participar do evento online Enase, do Canal Energia.
A MP estabelece que o Poder Executivo tem 12 meses para definir diretrizes para implementação de mecanismos que considerem os benefícios de cada fonte de energia em termos de baixas emissões de gases do efeito estufa.
No RenovaBio, citado pelo presidente da EPE, distribuidoras de combustíveis precisam cumprir metas de descarbonização individuais, o que pode ser feito por meio da compra de certificados de descarbonização (CBios) emitidos por produtores de biocombustíveis.
Até meados deste mês, a associação do setor sucroenergético Unica contabilizava emissão de lastro para 8,54 milhões de CBios, cerca de 60% da meta para 2020, citando dados da reguladora ANP desde o início do RenovaBio, em dezembro de 2019.
O presidente da EPE disse que a estatal ainda tem avaliado os impactos da mudança climática sobre a geração hidrelétrica -- carro-chefe da matriz brasileira, mas que tem gradualmente perdido participação na expansão para usinas eólicas e solares.
Os efeitos poderiam envolver uma redução no longo prazo das afluências, ou o volume de água que chega aos lagos das hidrelétricas para ser transformado em energia.
“Em alguns cenários experimentamos o efeito que haveria com a redução das afluências e como isso afetaria não só a segurança, mas os custos de operação... nesse sentido é bastante impactante, dependendo dos cenários, dependendo da criticidade desses efeitos (do clima)”, afirmou Barral.
SEM SUBSÍDIOS
A avaliação de mecanismos para valorar benefícios das fontes de energia em termos de emissões veio como contrapartida pela retirada, prevista na MP 998, de subsídios concedidos a renováveis como eólicas, solares e usinas a biomassa, vistas pelo governo como já competitivas demais para o incentivo.O fim dos subsídios, que ainda precisa ser validado pelo Congresso com a aprovação da MP, valeria apenas para novos projetos e teria um prazo de transição de 12 meses pelos quais o incentivo ainda seria concedido a novas outorgas.
Para o ex-diretor do Greenpeace e fundador do Instituto Escolhas, Sergio Leitão, a retirada desse apoio às renováveis é uma medida meritória, dada a redução de custos das tecnologias, enquanto os mecanismos de valoração por fonte têm potencial para ser algo “revolucionário e inovador”.
Ele alfinetou, no entanto, a ausência de discussão sobre a retirada de subsídios à geração a carvão e com térmicas a óleo hoje existentes.
“Em um país com sol, vento, você fica flertando com essas coisas tão do passado... o carvão e o combustível fóssil são as fonte do passado, eles estão aí subsistindo exatamente porque respiram por aparelhos.”
A Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), fundo abastecido por encargos na conta de luz que banca diversos subsídios e programas sociais, movimentou 20,2 bilhões de reais em 2019, segundo estudo do Instituto Acende Brasil.
Desse valor, 690 milhões de reais foram para apoio ao carvão mineral nacional e 6,3 bilhões de reais para a Conta de Consumo de Combustíveis (CCC), que custeia geração com térmicas a óleo em regiões isoladas da rede elétrica, ainda segundo estudo do Acende Brasil em parceria com a PwC.
Por Luciano Costa (Reuters)