Com a fuga do presidente afegão, Ashraf Ghani, os talibãs assumiram facilmente, no último domingo (15), o controle do palácio presidencial em Cabul, 20 anos após a derrota para a coalizão internacional liderada por Washington. O movimento está agora na liderança de um país que nem o império britânico, nem a União Soviética ou os Estados Unidos souberam redesenhar. Nesta chegada à força, uma nova geração de homens sai da escuridão.
O Talibã nasceu após o fracasso da longa invasão soviética no Afeganistão e controlou o país até 2001. Após os ataques de 11 de setembro, uma ofensiva foi lançada contra os fundamentalistas para a caça de seu líder, Osama bin Laden, capturado apenas em 2011.
Em 6 de dezembro de 2001, o Emirado Islâmico do Afeganistão capitulou e um governo interino, presidido por Hamid Karzaï, assumiu o poder. Foi ele quem venceu a primeira eleição presidencial da história do país, enquanto os talibãs se entricheiram em províncias afegãs do leste e sul.
No início dos anos 2000, o movimento se juntou a outros grupos radicais de zonas tribais paquistanesas e se reestruturou rapidamente em 2003, aproveitando das baixas de militares ocidentais na guerra do Iraque. No plano financeiro, eles eram apoiados pelo comércio do ópio e recebiam também ajudas externas.
Diante da nova formação, o então presidente americano, George W. Bush, reforçou a presença militar no Afeganistão em 2008. Em 2009, Barack Obama seguiu o mesmo caminho. A morte de Bin Laden, em 2 de maio de 2011, pelas forças dos Estados Unidos no Paquistão levou o governo americano a anunciar a retirada progressiva de suas tropas. Junto com as suspeitas de fraude que levam a uma nova vitória de Ashraf Ghani, em 2014, Cabul perde força.
No final de 2014, a ONU resolveu enterrar sua missão no país, fortalecendo o Talibã. Em 2015, o grupo Estado Islâmico também se tornou ativo no país. Apesar do reforço enviado por Donald Trump, os ataques dos insurgentes se amplificaram. Mas, em 2020, o movimento assinou um acordo histórico com os Estados Unidos, assinalando uma saída das tropas americanas e deixando o terreno livre para 75 mil radicais.
Reestruturação do poder
Enquanto cientistas políticos do mundo inteiro preveem um retorno aos rígidos anos de sharia islâmica, algumas lideranças dizem que ainda é cedo para tentar adiantar como o grupo vai assumir o poder. "Primeiro queremos que todas as potências estrangeiras deixem o país para que possamos estruturar nosso governo", afimou um representante do Talibã, sem se identificar, à agência Reuters.
Passados vinte anos, de fato, os rostos mudaram. O mulá Omar morreu em 2013; Mansur em 2016. Desde então, uma nova geração se instalou, ainda que uma aura de mistério paire sobre os veteranos. Para os analistas, no entanto, não há dúvidas de que o carro chefe do movimento é atualmente dirigido pelo mulá Haibatullah Akhundzada, um erudito, filho de um teólogo.
Originário de Kandahar, no sul, berço do movimento, Akhundzada dirigia o sistema judiciário do Talibã. Aos olhos de muitos cientistas políticos, sua liderança seria mais simbólica que operacional hoje. No entanto, ele tem uma influência incontestável entre os insurgentes. Discreto desde a morte de Mansur, em 2016, limitava-se a divulgar raras mensagens anualmente durante datas consideradas sagradas. Mas com o tempo e o apoio que recebeu, vem se destacando na galáxia do islamismo radical internacional.