Um passo importante para a entrada do Brasil na Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) foi dado nesta terça-feira (25). A entidade concordou em aprovar um convite para o país iniciar o processo de adesão, depois de anos de hesitação. Entretanto, a iniciativa acontece a nove meses das próximas eleições brasileiras – que poderão redefinir o interesse do próprio país em integrar a entidade, apelidada de “clube dos ricos”.
Texto por: Lúcia Müzell rfi
O novo secretário-geral da OCDE, Mathias Cormann, assumiu o cargo em 2021 disposto a avançar a abertura para novos membros. O conselho de ministros da organização aprovou o convite para seis países de uma só vez – Argentina, Peru, Romênia, Croácia e Bulgária completam o grupo.
O Brasil participa e colabora com a organização há quase três décadas, porém uma solicitação formal de ingresso jamais foi apresentada pelos governos do Partido dos Trabalhadores, que viam com reservas a adesão à entidade. Esse desejo foi manifestado pelo ex-presidente Michel Temer e oficializado por Jair Bolsonaro, em 2018.
“Fazer o convite agora é uma grande jogada da OCDE”, afirma economista Antônio Carlos Alves dos Santos, professor de economia internacional da PUC-SP. "Não tenho a menor dúvida de que ocorrer neste momento é um instrumento de pressão sobre o futuro governo. A OCDE coloca a nova administração numa posição desconfortável de ter de dizer não, se não quiser mais aderir."Papel do Estado
“A questão econômica sempre foi um forte entrave para economistas desenvolvimentistas, que têm uma visão diferente da OCDE em relação à participação do Estado”, pontua. “Por outro lado, essa visão de que o Estado devia ser mínimo está sendo questionada, com a pandemia, e pode haver maior flexibilidade agora”, ressalta.
O embaixador Carlos Cozendey, encarregado do Ministério das Relações Exteriores para negociar o ingresso do Brasil, contemporiza. “O Brasil tem cooperado com a OCDE desde os anos 1990, ao longo de diferentes governos, de diferentes partidos. O aumento da participação em comitês e a adesão a instrumentos foi constante neste período”, frisa o diplomata, que atua em Paris, onde se situa a sede da organização que reúne 38 países.
Integração internacional
"Acho que a aproximação com a OCDE tem que ser vista como uma questão de Estado. A OCDE tem uma influência universal. Se você vai ser exposto a esses padrões e acabar tendo que segui-los, é melhor participar da sua elaboração”, observa Cozendey, ao lembrar que Brasília desempenha um papel atuante em instâncias internacionais como o G20.O embaixador frisa que dos 251 instrumentos da OCDE aos quais os países-membros devem se adequar, o Brasil já aderiu a 103. Brasília também participa formalmente de mais de 30 comitês sobre diferentes aspectos de políticas públicas recomendadas pela organização – uma dinâmica que se acelerou desde o pedido formal de ingresso.
"O quadro que a gente tem hoje é que, em 90% dessas normas, já há uma coincidência muito grande da legislação e da prática brasileira. Às vezes, demanda alguma mudança de legislação ou de políticas”, explica, a exemplo da área tributária, em que reformas estruturais seriam necessárias para adaptar o país aos trilhos da OCDE.
Em outros aspectos, o problema é a implementação de leis já existentes, como as ambientais. "É claro que na área do desmatamento, os países vão esperar resultados e a gente terá de apresentar”, sublinha Cozendey.