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Ucrânia: violência sexual, uma arma que ultraja a dignidade


Violência sexual como arma de guerra. Do conflito na Ucrânia chegam inúmeros relatos de crimes sexuais contra mulheres, crianças e homens cometidos por militares russos. Várias iniciativas foram postas em prática para apoiar e ajudar as vítimas que muitas vezes têm medo de pedir ajuda. Desde 2015, a cada 19 de junho a ONU celebra o Dia Internacional para a Eliminação da Violência sexual em conflitos armados.


Vatican News

Desde a primeira semana da guerra, Pavlo, líder de uma comunidade cristã no sul da Ucrânia, ajudou a evacuar as pessoas das áreas mais afetadas. Ele conseguiu ir a lugares ocupados pelo exército russo para levar comida e remédios aos necessitados. Ele ajudou mulheres e crianças que queriam fugir desses lugares.

"Todos sabem o que aconteceu em Bucha - diz - mas é preciso entender que a 'Bucha' está localizada ao longo de toda a linha de demarcação e nas áreas ocupadas, onde a pessoa que tem uma arma na mão se sente superior aos demais. 

É evidente que há episódios de violência sexual nesses locais. Tanto as mulheres, que fugiram, quanto o médico-chefe do hospital onde levamos os remédios me contaram sobre isso. É por isso que sempre tentamos fazer com que o maior número possível de pessoas fugisse de lá, principalmente mulheres e crianças”.


O número de vítimas

A violência sexual em conflitos armados não é apenas um crime, mas é uma violação do direito internacional humanitário e dos direitos humanos. Durante um briefing realizado no início de junho no Ukraine Media Center (Kyiv), a vice-ministra do Interior da Ucrânia, Kateryna Pavlichenko, disse que no início da invasão russa em larga escala, os policiais receberam cerca de meia centena de denúncias de crimes sexuais cometidos por os militares russos. Ele também acrescentou que as informações sobre outros fatos ainda estão sendo examinadas pelos investigadores: as vítimas são identificadas e, em seguida, as evidências relevantes são coletadas.

De acordo com Pavlichenko, as unidades da polícia nacional já confirmaram informações sobre o estupro de meninas menores de idade e também há fatos confirmados de estupro de mulheres idosas. A vice-ministra disse que a maioria desses crimes sexuais cometidos por soldados russos contra civis são detectados e registrados nos territórios há mais tempo ocupados pelos invasores.

“Será difícil entender a extensão desses crimes, porque nem todos estão dispostos a falar sobre eles, denunciá-los e pedir ajuda. As vítimas nem sempre estão dispostas a falar”. O funcionário acrescentou que as agências de aplicação da lei também oferecem às vítimas a oportunidade de recorrer a especialistas para obter apoio e assistência adequados.

“Será difícil entender a extensão desses crimes, porque nem todos estão dispostos a falar sobre eles, denunciá-los e pedir ajuda. As vítimas nem sempre estão dispostas a falar”. Foto: Bulent Kilic/AFP


Apoio psicológico

O psicoterapeuta e professor Roman de Vinnytsia (da Ucrânia central) explica que no momento é muito difícil estimar o número de vítimas de violência sexual. “Estamos diante de uma situação que não é normal - diz ele - e na perspectiva da guerra, devemos considerar também este terrível fenômeno que é a violência. Precisamos entender que a violência sexual é uma ferramenta de guerra. 

E mesmo que por enquanto não tenhamos a medida de quanto esse instrumento foi, ou é usado na Ucrânia, com base na minha prática profissional ou na de meus colegas, fica claro que ele constitui em todos os aspectos uma parte do arsenal militar russo, um dos meios que os soldados russos usaram e estão usando não apenas contra as mulheres ucranianas, mas também contra homens e crianças. É uma das formas, não só de humilhar essas pessoas, mas também de ultrajar a dignidade do nosso povo”.

“A violência sexual - continua o psicoterapeuta - fere profundamente a pessoa humana, o seu corpo. Para isso a vítima, antes de tudo, deve ir ao médico para receber os primeiros socorros. O segundo 'campo de batalha' são as emoções: é muito difícil lidar com o estado emocional que surge após a violência sofrida - vergonha, culpa e medo. Por isso as vítimas muitas vezes não denunciam”.

“O tema é muito delicado, - explica o estudioso, - precisamos criar espaços em que as vítimas de violência sexual possam se sentir acolhidas e compreendidas. É necessário criar mecanismos simples para que elas possam recorrer à ajuda, tornar públicas as linhas de assistência telefônica ou os endereços de e-mail, para os quais possam se dirigir. Os representantes das autoridades policiais ou públicas devem falar publicamente sobre isso para explicar como denunciar esses crimes e obter ajuda. As vítimas muitas vezes têm medo de encontrar pessoas incompetentes e insensíveis nas instituições a que recorrem. Em vez disso, devemos fazê-los entender que devem recorrer a especialistas - médicos e psicólogos - o mais rápido possível".

O Dia contra a violência sexual nos conflitos armados

O Dia Internacional para a Eliminação da Violência sexual em conflitos armados foi instituído em 19 de junho de 2015 pela Assembleia Geral das Nações Unidas para por um fim a uma prática desumana e homenagear as milhares de vítimas de violência sexual em conflitos. Esta data coincide com a adoção da Resolução 1820 do Conselho de Segurança da ONU, em 2008, que reconheceu a violência sexual como estratégia de guerra e como ameaça à paz e segurança mundiais. Na Resolução, reconhece-se que o estupro e outras formas de violência sexual podem constituir crimes de guerra e crimes contra a humanidade e se pede a cessação imediata e completa dos atos de violência sexual contra civis por todos os atores envolvidos em um conflito armado.

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