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Maioria do TSE mantém decisão que declarou Bolsonaro inelegível



Em julgamento virtual, ministros negaram recurso do ex-presidente


Foto: Marcello Casal JR/Agência Brasil 

Agência Brasil 🇧🇷 

A maioria dos ministros do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) negou hoje (22) recurso para derrubar a decisão que tornou o ex-presidente Jair Bolsonaro inelegível por oito anos. O julgamento do caso foi iniciado na madrugada desta sexta-feira no plenário virtual do tribunal.

Em junho deste ano, Bolsonaro foi condenado pelo TSE por abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação pela reunião realizada com embaixadores, em julho do ano passado, no Palácio da Alvorada, para atacar o sistema eletrônico de votação. A legalidade do encontro foi questionada pelo PDT.

Até o momento, quatro dos sete integrantes do TSE rejeitaram o recurso da defesa. Além do relator, Benedito Gonçalves, votaram no mesmo sentido Alexandre de Moraes, André Ramos Tavares e Cármen Lúcia. Faltam os votos de Raul Araújo, Floriano de Azevedo Marques e Nunes Marques.

No recurso apresentado ao TSE, os advogados de Bolsonaro alegaram que houve cerceamento de defesa no julgamento pela falta de análise de todos os argumentos apresentados pela defesa e para apresentação de testemunhas.

O caso é analisado no julgamento virtual, no qual os ministros inserem os votos no sistema eletrônico e não há deliberação presencial. A análise do recurso está prevista para terminar no dia 28 deste mês.

Por que governo Bolsonaro é investigado por suspeita de genocídio contra os yanomami

PF vai investigar se houve omissão de agentes públicos no território yanomami durante governo Bolsonaro. CRÉDITO,BRENDAN SMIALOWSKI/AFP


  • André Biernath - @andre_biernath
  • Da BBC News Brasil em Londres


A Polícia Federal anunciou a abertura de um inquérito para investigar se houve crime de genocídio e omissão de socorro ao povo yanomami pelo governo de Jair Bolsonaro (PL).


A investigação vai começar após um pedido feito por Flávio Dino, ministro da Justiça e da Segurança Pública, um dos integrantes da comitiva que visitou o território indígena no dia 21 de janeiro.


Outras duas denúncias estão em avaliação preliminar no Tribunal Penal Internacional, localizado em Haia, nos Países Baixos. Nelas, a Associação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e a Comissão Arns defendem que o ex-presidente cometeu crimes de genocídio durante a pandemia de covid-19 e na forma como ele lidou com a proteção dos indígenas nos últimos quatro anos.


Procurado pela reportagem, Bolsonaro não comentou o tema. Antes, Bolsonaro escreveu em aplicativo de mensagens que a denúncia sobre a crise yanomami era "farsa da esquerda" e argumentou que seu governo levou atenção especializada para territórios indígenas.


Quais são os argumentos que fundamentam acusações tão graves? E o que mais disse Bolsonaro?


Os juristas ouvidos pela BBC News Brasil apontam que há elementos suficientes para iniciar uma investigação, mas que é preciso encontrar evidências e provas para seguir com eventuais julgamentos no futuro. A seguir, entenda como, segundo eles, questões como estímulo ao garimpo, apuração sobre desvio de medicamentos e alertas ignorados pelo governo podem ser levados em consideração.



O que é genocídio?

O Tribunal Penal Internacional diz que o genocídio é caracterizado pela "intenção específica de destruir, no todo ou em parte, um grupo nacional, étnico, racial ou religioso, matando seus membros por outros meios, causar lesões corporais ou mentais graves, impor deliberadamente ao grupo condições de vida calculadas para provocar a destruição física total ou parcial, impor medidas destinadas a prevenir nascimentos ou transferir forçadamente crianças de um grupo para outro".


A jurista Sylvia Steiner, única brasileira que foi juíza da corte de Haia entre 2003 e 2012, explica que "genocídio não é qualquer matança".


"Tem que existir a intenção de destruir um grupo por causa da nacionalidade, da etnia, da raça ou da religião dele", resume.


A especialista também aponta que há uma diferença entre genocídio e crimes contra a humanidade.


"Crimes contra a humanidade são aqueles praticados por parte de uma política de um Estado ou de uma organização que atacam a população civil. Eles incluem assassinato, violência sexual, deportação forçada, perseguição, extermínio, escravidão…", lista.


"Nesse caso, não existe um dolo especial, ou seja, a intenção clara de eliminar um grupo por questões como nacionalidade, etnia, raça, religião", complementa.

Localizado em Haia, o Tribunal Penal Internacional julga casos de genocídio e crimes contra a humanidade. GETTY IMAGES


O advogado Belisário dos Santos Junior, da Comissão Internacional de Juristas, lembra que o Brasil possui uma lei sobre o genocídio desde 1956.


"Ela foi aprovada ainda no governo de Juscelino Kubistchek, que reconhece não apenas a ação direta, mas também a incitação ao genocídio", diz.


A lei brasileira, portanto, também pune aqueles que estimulam "direta e publicamente alguém a cometer qualquer dos crimes" relacionados ao genocídio.


Mas o que pode pesar contra o governo Bolsonaro durante as investigações?


Estímulo ao garimpo

O relatório Yanomami Sob Ataque, publicado em abril de 2022 pela Hutukara Associação Yanomami e pela Associação Wanasseduume Ye'kwana, com assessoria técnica do Instituto Socioambiental, faz um balanço da extração ilegal de ouro e outros minérios nessa região, que compreende a maior reserva indígena do país.


"Sabe-se que o problema do garimpo ilegal não é uma novidade na TIY [Terra Indígena Yanomami].  Entretanto, sua escala e intensidade cresceram de maneira impressionante nos últimos cinco anos. Dados do MapBiomas indicam que a partir de 2016 a curva de destruição do garimpo assumiu uma trajetória ascendente e, desde então, tem acumulado taxas cada vez maiores. Nos cálculos da plataforma, de 2016 a 2020 o garimpo na TIY cresceu nada menos que 3.350%", aponta o texto.


O levantamento das associações mostra que, em outubro de 2018, a área total destruída pelo garimpo somava pouco mais de 1.200 hectares. "Desde então, a área impactada mais do que dobrou, atingindo em dezembro de 2021 o total de 3.272 hectares", continua a publicação.

Mineração e falta de políticas públicas representam ameaças aos povos indígenas, defende corte internacional. GETTY IMAGES

Durante os quatro anos de presidência, Bolsonaro falou diversas vezes sobre a mineração em terras indígenas — o governo propôs inclusive um projeto de lei que viabilizaria a prática dentro da lei.


Em março de 2022, por exemplo, ele afirmou que "índio quer internet, quer explorar de forma legal a sua terra, não só para agricultura, mas também para garimpo".


"A Amazônia é uma área riquíssima. Em Roraima, há uma tabela periódica debaixo da terra", acrescentou.


Santos Junior, que integra a Comissão Arns, entende que são vários os exemplos do estímulo de Bolsonaro ao garimpo.


"Os garimpeiros vão se apropriando das áreas, desmatam a floresta, invadem unidades básicas de saúde… Quem dá suporte a isso é justamente quem incentiva o garimpo e o desmatamento, quem não dá as condições para que povos e etnias sobrevivam", defende.


Falta de remédios e alimentos

O Ministério Público Federal também fez operações para apurar desvios de medicamentos em território yanomami.


Segundo o órgão, só 30% de mais de 90 tipos de medicamentos que deveriam ser fornecidos foram entregues em 2022.


Os procuradores dizem que o desvio de vermífugos (que tratam de infestações de vermes) impediu o tratamento adequado para 10 mil das 13 mil crianças que vivem nesta região.


Há ainda denúncias sobre a interrupção no fornecimento de alimentos.


Alisson Marugal, procurador da República em Roraima, afirmou que o Ministério da Saúde cortou o fornecimento de alimentação aos indígenas nos postos de saúde do Estado em 2020, sem dar explicações.


Todo o cenário de casos e mortes por desnutrição e malária fez com que o Ministério da Saúde decretasse uma emergência sanitária no território yanomami em 21 de janeiro.


Entre as ações emergenciais, o governo anunciou o envio de profissionais de saúde e a criação de hospitais de campanha para atender os pacientes.


Segundo o secretário de Saúde Indígena do ministério, Ricardo Weibe Tapeba, mais de mil indivíduos já foram resgatados em situação de extrema vulnerabilidade do local.

Em visita ao território yanomami, Lula diz que a situação é 'desumana'. RICARDO STUCKERT/PR

Alertas ignorados

Por fim, diversas instituições nacionais e internacionais chamaram a atenção para o que vinha acontecendo com os yanomami nos últimos meses e anos.


Em nota, a Apib disse que a invasão do garimpo ilegal na terra indígena yanomami foi denunciada pelo menos 21 vezes à justiça e aos órgãos do governo durante a gestão de Bolsonaro.


Existe também uma petição feita ao Supremo Tribunal Federal em maio do ano passado sobre esse assunto. Nela, a Apib e outras entidades pedem ações do governo para conter a invasão de garimpeiros nas terras onde vivem os yanomami e outros povos, como os munduruku.


No dia 1º de julho de 2022, a Corte Interamericana de Direitos Humanos emitiu uma decisão cobrando uma resposta do Brasil para "proteger a vida, a integridade pessoal e a saúde dos membros dos povos indígenas yanomami, ye'kwana e munduruku".


A comissão que avaliou o caso disse que a situação dos indivíduos dessas três populações era de "extrema gravidade e urgência".


Entre as medidas que o país precisaria tomar, a corte apontou a necessidade de "proteger efetivamente a vida, a integridade pessoal, a saúde e o acesso à alimentação e água potável" desses povos.


A corte pediu ao Estado brasileiro um relatório com um resumo das ações que foram tomadas para reverter a situação até o dia 20 de setembro de 2022. Depois disso, novas atualizações sobre o caso deveriam ser enviadas a cada três meses.


A BBC News Brasil entrou em contato com a Corte Interamericana de Direitos Humanos para saber se o país estava cumprindo as medidas.


Por meio da assessoria de comunicação, o órgão afirmou que, "até o dia de hoje, a corte está esperando uma resposta por parte do Estado brasileiro".


O que pode acontecer?

Para Santos Junior, "o ex-presidente, por causa de suas obsessões [com o garimpo], aparenta preencher os requisitos de quem assume os riscos". "Não é normal você deixar um povo sem assistência médica, sem as condições mínimas de sobrevivência", diz.


"Os indígenas foram sufocados de uma tal forma que as mortes e a redução do grupo se encaixam, a meu ver, na descrição do genocídio pelas ações ou inações do então Presidente da República", acrescenta o advogado.


A jurista Sylvia Steiner pondera que a abertura de um inquérito serve justamente para fazer investigações e reunir provas de possíveis crimes que foram eventualmente cometidos.


"Por ora, não há fatos provados. Existem alguns indícios em relação ao genocídio. E isso é sempre complicado, porque você precisa comprovar que havia uma intenção de eliminar os yanomami da face da Terra", explica.


Na visão da jurista, outra possibilidade é investigar possíveis crimes contra a humanidade — e não o genocídio.


"Pode ser observada a existência de um plano, de uma política de Estado contra os yanomami, mas em função da terra que eles ocupam e do interesse em se apropriar das riquezas que existem ali. Ou seja, nesse caso não falamos de uma perseguição dos yanomami por causa da etnia deles", pontua.


"Acontece que essa política de Estado leva à exterminação do grupo. Então, nós podemos estar diante de um crime contra a humanidade de extermínio ou perseguição", completa.


Steiner chama a atenção para o fato de a legislação brasileira não prever crimes contra a humanidade. Nesse caso, a eventual investigação e um julgamento posterior dependem da ação do Tribunal Penal Internacional.


A especialista aponta que esses julgamentos em Haia, de possíveis responsáveis pelos atos criminosos, podem render penas de até 30 anos ou prisão perpétua em casos extremos.


Comunidades que fazem parte da Reserva Yanomami enfrentam crise humanitária que tem como principal causa a expansão do garimpo ilegal. ANDRESSA ANHOLETE/CORRESPONDENTE GETTY IMAGES

Controvérsias e discordâncias

Steiner aponta que o conceito de genocídio e crimes contra a humanidade é alvo de muitas discussões entre os juristas.


"Uma parcela acredita que, decorrido tanto tempo desde que o conceito foi definido nos anos 1940, é preciso ter um entendimento um pouco mais alargado do que é um genocídio. Eles argumentam que o mundo mudou e a interpretação desse crime deveria ser mais flexível", diz


"Eu me situo entre aqueles que seguem a letra da lei. Então, para mim, tem que ficar demonstrado que realmente houve a intenção genocida, a intenção de destruir no todo ou em parte aquela comunidade, seja em razão da religião, da etnia, da raça ou na nacionalidade."


"Fora disso, pode ser que estejamos diante de um crime contra a humanidade, que é tão grave quanto", complementa.


De acordo com a especialista, o conceito de crimes contra a humanidade é relativamente novo — foi ratificado internacionalmente a partir do Estatuto de Roma em 2002 — e, por isso, ainda gera confusão.


"Esse conjunto de normas está acima das regras dos países e proíbe uma série de condutas que põe em risco a paz e a humanidade de comunidades inteiras", conta Steiner.


"Quando temos escândalos lamentáveis e catástrofes humanitárias, devemos usar esse momento para progredir do ponto de vista moral e ético. Que a atual situação desperte as pessoas e os países para as necessidades especiais das populações indígenas. Já não era sem tempo", conclui.


A BBC News Brasil tentou o contato com Bolsonaro por meio de assessores, ex-ministros, pessoas próximas, a comunicação do Partido Liberal e pelas próprias redes sociais para que ele pudesse dar um posicionamento a respeito de todos os pontos e alegações. Não foram enviadas respostas até a publicação desta reportagem.


Assim que a emergência de saúde veio à tona nos últimos dias, o ex-presidente fez postagens no aplicativo de mensagens Telegram.


Ele classificou a denúncia sobre a crise yanomami como "farsa da esquerda" e disse que seu governo realizou 20 ações de saúde entre 2020 e 2022 que levaram atenção especializada para dentro dos territórios indígenas, especialmente em locais remotos e com acesso limitado.


Segundo o ex-presidente, foram beneficiados mais de 449 mil indígenas, com 60 mil atendimentos. Ainda na mensagem, ele afirmou que o governo federal encaminhou 971,2 mil unidades de medicamentos e 586,2 mil unidades de equipamentos de proteção individual, totalizando 1,5 milhão de insumos enviados para essas operações.


- Este texto foi publicado em https://www.bbc.com/portuguese/brasil-64417930

Deputados dos EUA pressionam Biden a expulsar Bolsonaro




Em carta, 46 congressistas pedem ao líder americano que revogue permissão de permanência do ex-presidente brasileiro. Texto também exige investigação de possíveis ações tomadas nos EUA em apoio aos ataques em Brasília.

Bolsonaro está na Flórida desde dezembro, quando abandonou a Presidência dois dias antes da posse de Lula. © Evaristo Sa/AFP


 Deutsche Welle

Cresce a pressão nos Estados Unidos para que o presidente do país, Joe Biden, force Jair Bolsonaro a deixar o território americano, na esteira dos ataques perpetrados por apoiadores extremistas do ex-presidente na Praça dos Três Poderes, em Brasília, em 8 de janeiro.


Um grupo de 46 congressistas do Partido Democrata enviou uma carta a Biden pedindo que ele revogue o visto diplomático ou qualquer permissão que Bolsonaro tenha para permanecer nos EUA.


No documento, os parlamentares também exigem que o governo "investigue qualquer ação tomada em solo americano para ajudar a insurreição" ocorrida em Brasília, seja apoiando, coordenando ou financiando os atos golpistas e violentos.


"Não devemos permitir que Bolsonaro ou qualquer outro ex-funcionário do governo brasileiro se refugie nos Estados Unidos para escapar da justiça por crimes que possam ter cometido durante seu mandato, e devemos cooperar plenamente com qualquer investigação do governo brasileiro sobre suas ações, se solicitado", escreveram os congressistas na carta.


Visto de autoridade

O ex-presidente de extrema direita está na Flórida desde o fim de dezembro, quando abandonou a Presidência da República dois dias antes da posse de Luiz Inácio Lula da Silva.


Na carta, os democratas observam que Bolsonaro entrou nos EUA ainda como chefe de Estado brasileiro, portando então um visto A-1, concedido a diplomatas ou funcionários de governos.

Vídeo relacionado: Congressistas querem expulsão de Bolsonaro dos EUA (Dailymotion)


"Como ele não é mais o presidente do Brasil, nem está servindo atualmente como funcionário do governo brasileiro, solicitamos que se reavalie o status dele no país para determinar se existe uma base legal para sua estada e se revogue qualquer visto diplomático que possa ter", afirmam.


O governo americano ainda não se manifestou sobre o status legal que Bolsonaro mantém nos Estados Unidos.


Contudo, o porta-voz do Departamento de Estado americano, Ned Price, afirmou na segunda-feira que estrangeiros que entram nos EUA com um visto A-1 têm 30 dias para deixar o país se não fizerem mais parte de um governo."Ameaça às instituições democráticas"

Na carta, os congressistas também dizem que Bolsonaro, durante seu governo, ameaçou as instituições democráticas e que suas ações incitaram apoiadores radicais a cometerem atos de violência.


"Sua disseminação de desinformação, sua recusa em pedir a seus apoiadores que aceitassem os resultados das eleições e seus apelos ativos para se mobilizar contra as instituições democráticas incitaram milhares de manifestantes a invadirem prédios do governo e se envolverem em atos violentos", afirma o texto.


Após os ataques golpistas de 8 de janeiro, Biden conversou por telefone com o presidente Lula e expressou "o apoio inabalável dos Estados Unidos à democracia no Brasil".


A condenação entre congressistas americanos também foi rápida, bem como o apoio à expulsão de Bolsonaro do país. Ainda no dia 8, o deputado democrata Joaquín Castro, do Texas, pediu a extradição do ex-presidente brasileiro.


"Ele é um homem perigoso. Deveriam mandá-lo de volta para seu país natal, o Brasil", disse o deputado. "Apoio o presidente Lula e o governo democraticamente eleito no país", completou o democrata, que também relacionou a invasão em Brasília com o ataque ao Capitólio americano em 2021. "Terroristas domésticos e fascistas não podem usar a cartilha de Trump para minar a democracia."


A deputada democrata Alexandria Ocasio-Cortez, de Nova York, também relacionou os eventos em Brasília com o Capitólio: "Vemos fascistas tentando fazer o mesmo no Brasil." Na mesma mensagem, ela manifestou solidariedade a Lula e apoiou o fim do "refúgio" de Bolsonaro nos EUA.


ek (Efe, AFP)

“Plataformas digitais foram coniventes com atos antidemocráticos em Brasília”, diz especialista



As plataformas digitais ocuparam um papel central na organização dos atos antidemocráticos e de vandalismo que ocorreram contra as instalações do Palácio do Planalto, do Congresso Nacional e do Supremo Tribunal Federal no último domingo (8). O incidente expõe a falta de estrutura e de capacidade de análise para gerenciar essas informações nas redes, mas, principalmente a conivência dos ambientes digitais com os ataques bolsonaristas.


Por Andréia Gomes Durão, da RFI

De acordo com o Desinformante, especializado na análise da veracidade das informações compartilhadas nas redes e seus impactos na sociedade, um grupo de pesquisadores realizou um levantamento sobre a movimentação nos grupos e canais bolsonaristas e golpistas que culminaram nas cenas de terrorismo.


A organização dos atos foi realizada durante toda a semana, com caravanas chegando à Brasília. Essas viagens foram amplamente divulgadas como ‘tudo pago’ nas redes para atrair mais manifestantes. O grupo de pesquisadores também indicou que a narrativa foi impulsionada por influenciadores e políticos bolsonaristas nas redes sociais, a exemplo do deputado Bibo Nunes.


Nina Santos, coordenadora do Desinformante e diretora do Aláfia Lab, destaca alguns pontos importantes nesse contexto, como o fato dos atos antidemocráticos estarem sendo anunciados e articulados há muito tempo, ainda que não se soubesse exatamente quando aconteceriam.

“Existe essa dificuldade de mensurar de fato qual vai ser a repercussão fora das redes dessas articulações que acontecem dentro das plataformas digitais. Mas uma série de entidades da sociedade civil já estava em diálogo com as plataformas durante todo o ano passado, sobre a necessidade de você ter políticas específicas para conter esse tipo de ato de movimento contra a ordem democrática. E nenhuma das plataformas digitais tem políticas para esse tipo de situação”, ela critica.


Nina Santos, coordenadora do *desinformante, diretora do Aláfia Lab e pesquisadora do INCT.DD © Arquivo pessoal


Sem políticas específicas

As plataformas teriam políticas para atos violentos, para questionamentos de resultados eleitorais, mas nenhuma tem políticas específicas para esse tipo de movimento, que não está necessariamente associado a um questionamento expresso do resultado eleitoral.


“Às vezes, as pessoas estão simplesmente pedindo intervenção militar ou, enfim, usando outro tipo de argumento que não seja questionar o resultado das urnas diretamente, ainda que seja óbvio que isso esteja no background e também não necessariamente estão convocando para atos violentos”, explica Nina, que também é pesquisadora do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Democracia Digital (INCT.DD).


Para a especialista, quando as pessoas convocam a ocupação do Congresso, por exemplo, não necessariamente estão apelando para a violência. E as plataformas digitais tinham sido alertadas para isso, uma vez que já tinham participado de um episódio semelhante, há dois anos, nos Estados Unidos, com a invasão do Capitólio.


“As plataformas já sabiam que isso poderia acontecer. Então foi de fato, sim, uma leniência e um despreparo total e absoluto. As plataformas diziam que tinham protocolos de crise para esses momentos, mas esses protocolos ou não existem ou não foram colocados em prática”, adverte a pesquisadora.


“As plataformas digitais foram muito coniventes com esses atos antidemocráticos, deixaram rolar solto”, continua Nina, “A gente teve vídeos, teve transmissões ao vivo, teve monetização inclusive desses conteúdos. Pedidos de doação de dinheiro sendo feito diretamente em plataformas como YouTube. Então, foi um comportamento bastante grave nesse sentido”.


Como redes sociais foram usadas para ataques ao Congresso AFP - SERGIO LIMA


“Festa da Selma”

Outro ponto ressaltado pela especialista é a combinação de diferentes estratégias de rede, uma articulação nas redes privadas, especialmente Telegram e WhatsApp, mas teve também um uso bastante estratégico de redes mais abertas, como Twitter, Instagram e o próprio YouTube, usando expressões-código, inclusive, para tentar fugir dos monitoramentos.


A Agência Lupa, que também atua na análise da veracidade das informações que circulam nas plataformas digitais, identificou a expressão “Festa da Selma” como um dos códigos amplamente utilizados pelos golpistas para se referirem aos atos em Brasília.


Além da conivência das plataformas digitais, os episódios de golpismo também parecem ter trazido à luz uma grande falta de capacidade de monitoramento e de previsão desse tipo de ato.


“Há dois problemas principais que levam a essa falha: uma primeira é uma falha de fato de estrutura. Existem poucos ambientes ainda onde esse monitoramento de redes é feito de forma contínua, sistemática e eficiente. Houve uma mobilização maior durante o período de campanha, mas passado este período, sobretudo passado o período de posse, esses esforços foram sendo desmobilizados e ainda não estão mobilizados dentro da nova estrutura de governo”, aponta Nina Santos.


Além desta falta de percepção do quão estratégico é o monitoramento desses ambientes digitais, outra questão importante é a dificuldade de avaliação do que circula nessas redes.


“Quando chegamos a um momento como este, que é o ápice dessa mobilização, com invasão de instituições, a gente olha para as mensagens que estavam circulando, e estavam, sim, sendo monitoradas, e vemos que os indícios estavam ali. A questão é que são tantos indícios que fica difícil avaliar o que realmente vai gerar um movimento concreto de ataque à democracia e às instituições”, ela analisa.


“Depois que o fato acontece, é sempre mais fácil olhar e avaliar que aquilo era sim importante. Mas no momento em que acontece, é difícil de ter a dimensão que aquilo pode efetivamente tomar”, acrescenta.




Outro lado
Agora, a capilaridade e a dinâmica das redes sociais têm sido utilizadas contra os golpistas. Diversas iniciativas nas plataformas digitais unem esforços para localizar um número cada vez maior de bolsonaristas que participaram dos ataques na Esplanada dos Ministérios, em Brasília. No Instagram, a conta Contragolpe Brasil busca identificar essas pessoas, assim como a própria Agência Lupa, que criou um banco de dados para recolher posts antidemocráticos, com o objetivo de mapear como foram organizados os atos de vandalismo.


O movimento vem sendo seguido por celebridades e diversos políticos pró-governo, que compartilham o e-mail de denúncias criado pelo Ministério da Justiça (denuncia@mj.gov.br).


O ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes determinou, nesta segunda-feira (9), que o Facebook, o Twitter, o Instagram e o TikTok realizem a suspensão de canais e perfis identificados de manifestantes golpistas que participaram e incitaram a invasão do Congresso Nacional, da sede do STF e do Palácio do Planalto.


Além do bloqueio, Moraes determina que os dados cadastrais dos usuários e conteúdo das contas sejam fornecidos à corte.

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